Em 2006, apresentado pelo
professor Waldomiro Vergueiro, conheci o professor Elydio dos Santos Neto numa
das reuniões do Observatório de HQ da USP. A primeira impressão foi a de um ser
humano bem humorado e benquisto! Assim que lhe entreguei meu cartão-zine, foi
que ganhei mais ainda a confiança e a amizade inabalável que percorreu entre
Elydio Grande Alma e minha pessoa. Foi porque ele leu no meu cartão,
minha identificação: “Gazy Andraus: ser humano” antes de qualquer denominação
profissional. Ele gostou! Elydio é daquelas almas puras que estabelecem na vida
a prioridade do humano, mas atrelado a tal, a humanidade amiga, fraterna, antes
do ser técnico, frio e/ou arrogante. Para ele, minha apresentação mostrou-se
promissora. Ele apostou nisso, e creio que ambos conquistamos uma vida de
amizade amistosa, sólida, fraterna e sobretudo criativamente prolífica. Foram 7
anos que passaram como uma fase em que eu aprendi a ser mais humano ainda, pois
Elydio, sempre com o sorriso fraterno e o auxílio inteligentemente sábio, me mantinha
atento à importância do autoconhecimento para me tornar um humano melhor. Ele
me ajudou muito a que eu descobrisse a importância das histórias de vida como
autoconhecimento e aplicados na didática. Foi membro da banca de meu
doutoramento (e muito me ajudou na finalização da tese, com ampliação da
importância que as HQs traziam para a mente criativa). Elydio me levou a
conhecer o professor Ruy Cesar do Espírito Santo, que também prioriza o
autoconhecimento como aprimoramento evolutivo
e seu grupo de pesquisa INTERESPE. Elydio me dizia que aprendeu muito
comigo. Mas na verdade, o aprendizado maior foi meu: a humanidade dele me
projetou mais ainda pra ver o humano como potencialmente amoroso e digno, como
eu ainda não havia visto de tal monta! Elydio fez aulas de desenho de
quadrinhos em escolas, aprimorou seu traço e vontade de desenhar. Ele não só
foi teórico, mas praticou a criação de desenhos e histórias em quadrinhos. Viu
nos fanzines um caminho irrigado para a plantação de autorias criativas! Chegou
com a ideia dos Biograficzines, me convidando a auxiliá-lo a falar dos zines
para seus alunos de mestrado em Pedagogia da UMESP! Resultaram depois várias
associações entre mim e ele, então, quando fui convidado a escrever um texto
sobre os fanzines pela Cellina Muniz, chamei o Elydio pra escrevermos em dupla sobre
nossa experiência didática acerca dos Biograficzines que ele implantou na sua docência!
E daí o Elydio criou também seus Biograficzines com suas HQs poéticas e de histórias
de vida cheias de simbolismo.
Aquilo tudo rendeu, germinou e
alastrou-se...ficamos honrados várias vezes em participar de eventos de
fanzines como o Ugrapress, em que os fanzineiros gostavam de vê-lo falar, com
calma, conhecimento e ao mesmo tempo, abertura. Eles diziam que era ótimo
ter-nos, que somos do meio acadêmico, em meio aos zineiros, pois isso não só
dava respaldo à importância do fanzinato, como também ampliava a visão que os
outros tinham dos zines, já que Elydio trazia mais saberes acadêmicos mesclados
às criativas aberturas fanzineiras.
Elydio me visitou algumas vezes,
e conheceu meu pai. E quando meu pai se foi, ele veio com Marta me dar força e
energia naquele difícil momento...mas mais do que isso, ele teve visões
inusitadas de como meu pai estava na sua nova jornada, o que muito me deixou
contente! (se tiver curiosidade, leia aqui: http://www.ibacbr.com.br/?dir=artigos&pag=013&opc=0135).
Elydio valorizou meu trabalho a
um nível que eu não mais atinava: ele analisou minhas HQs, percebendo nuances e
significados onde eu não tinha percebido (devido à criação ser intuitiva), como
quando ligou os 9 meses de gestação aos 9 fios que prendiam um ser desenhado na
minha HQ “Casulo”.
Ele fez por mim o que os sábios e
guias fazem, sem nos deixar perceber que eles estão nos educando e nos guiando,
a um caminhar mais prolífico e ético...
Os valores que ele trazia eram
realmente imensos, como as alegrias de compartilhar momentos com ele (e muitas outras
vezes, quando juntávamos eu, Edgar Franco e Elydio, seja em eventos acadêmicos,
seja em outras ocasiões, em São Paulo, São Caetano, Goiânia, Recife etc, como um
trio realmente jovial e criativo, ao que também transparecia aos olhos de todos
– tamanha era sua energia espiritual, que meu afilhado Heitor, em Goiânia,
quando o conheceu, apelidou-o de “Buda”).
Elydio ainda escreveu um livro
sobre minhas HQs, fato que corroborou com meu apreço por ele, já que via nas
minhas HQs um valor de arte e significado que muito ampliava meu
autoconhecimento. E, embora em pleno tratamento contra a doença que o acometia,
veio no começo do ano para minha residência a fim de terminarmos a finalização
e revisão do livro. Veio de ônibus, voltou de ônibus, com a alegria e a força
que tinha e emanava! Criatura ímpar, com disposição e jovialidade! Suas falas e
aulas eram comedidas, pontuadas, sempre trazendo o melhor do ser humano ao ser
humano...
Por fim, sem me estender mais,
devo registrar alguns fatos ocorridos nessa última semana, em especial, o
sábado último do dia 28/09/2013, quando para casa dele e de Marta me conduzi, a
fim de me juntar a eles e seus outros convidados na comemoração de seu
aniversário (que verdadeiramente havia sido no dia 26). Lá chegando vi Elydio
deitado ao sofá, e cercado de amigos e parentes, logo o presenteei: numa caixa
de papelão de correio, cobri de imagens de HQs e pedaços de zines, montada
especialmente para a ocasião, tendo eu nela inserido algumas revistas de HQs,
mas também um desenho que fiz especialmente ao nobre e querido aniversariante,
que a tendo aberto e surpreso, apreciou ambos: a caixa e o desenho, sendo que
este último, o fiz entre os dias 27 e 28, realizado pelo impulso de dar uma
arte original ao meu amigo, como presente! Simbolicamente nele, aparece uma luz
vindo (ou saindo) do peito de um personagem, como uma rajada solar (ou algo que
o valha), e sobre a cabeça da figura, resta imponente também a cabeça de uma
águia, animal que ele tanto estimava (vide cópia de minha arte em anexo).
Naquela reunião final, Elydio se
mostrou aberto, e apesar de estar cansado, se sentou e cantou e durante um
determinado momento, agradeceu a todas as presenças, nomeando cada um, e
dizendo o valor de cada pessoa ali presente para sua vida.
Foi depois que a reunião
terminara que Elydio começou a se sentir mal, e o levaram ao pronto-socorro, e
por fim ao hospital...mas esses detalhes já não importam aqui, pois foi claro
pra mim que naquele dia Elydio teve reunidos com ele, pessoas que simbolizaram
a sua despedida, a qual (in)conscientemente fez, de uma maneira humana e tal
como um sábio tendo a seus pés pessoas atentas a escutá-lo!
E foi então que, assim como o
símbolo que Elydio mais gostava, a águia, ele, afinal, voou!
Mas nós que aqui ficamos, não
estamos desamparados. Tal qual se manifesta no desenho, ele como águia
permanece em espírito sobre todos os humanos, orientando e comungando para uma
humanidade cada vez melhor!
Voe, Elydio! Singre os céus da
vida ignota (para nós), mas amplificada e bela (para si)!
Abraço do seu grande amigo, que
muito te estima
Gazy, um humano! (04/10/2013)
Que texto lindo! Abraços meu irmão!
ResponderEliminarEmocionante, Gazy!
ResponderEliminarOntem, num curso que estava ministrando falei em você - e mostrei seu cartão e no Elydio. Relembrei o meu tempo de mestrado e todo apoio que ele me deu. Entre 19:00 - 20:00H Quando cheguei em casa li sua mensagem.
Estou triste, é verdade.Mas é verdade também , rica em conhecimento e que com isso sou uma pessoa melhor.
Muito lindo! E muito triste. Mas pelo que eu conheci do Elydio, acho que ele quer que a gente lembre dele do jeito que eu vou me lembrar, sorrindo. Ele vai ser sempre uma grande inspiração, um mentor ausente fisicamente, mas presente na obra, nas palavras e nas atitudes.
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